domingo, 22 de abril de 2012

Said and Done



“It had never ocurred to me that our lives, so closed interwoven, could unravel with such speed.”

[Never Let Me Go]       
                                                                  
Lembro de quando você me pedia palavras, baby, falava que merecia um texto. Merecia sim. Mas é agora, em nosso tempo quase póstumo, que eu sento pra nos repensar. Não existe presença, no máximo uma saudade comportada que grita na minha janela vez ou outra e senta tímida no canto, de castigo.

A gente se olha e não se vê. A gente só se reimagina com aqueles olhos de passado de quando chegamos a ser coisas bonitas. Há um par de anos escrevi “Somos um fardo. Dois fardos. Grandes, mas leves. Ou até pesados, mas podemos nos aliviar, dividir o peso. Emagrecer em conflito e então respirar”.

Tive medo ao descobrir ser feliz sem você e perceber que podia abrir mão de toda a felicidade que sempre soubemos fazer. Tive medo de nos transformar em uma ausência presente, de nos lembrar em saudades inconvenientes. Tive medo também de nos converter em presenças ausentes, daquelas que sobra corpo, mas falta alma.

Lembra de quando ela cantou no show e você me olhou? Ouve agora, aumenta o volume. Eu tive que deixá-lo ir, mas mesmo que eu não mais esteja, lembre que me ouviu dizer o quanto me importei e o que eu senti. Fui embora por vontade e também por vontade não voltarei, por isso agora tento economizar em palavras pra não gastar as memórias falhas.

Sempre nos considerei rabisco transformado em poesia, mas de repente me parece que a poesia regrediu e viramos redação clássica ensinada.  Hoje em dia usamos vírgulas, respeitamos a margem, somos contidos, nutrimos pudores entre nós.  E muros. Muros! Acredita? Antes éramos lar, baby, sem pressa.

Ninguém soube me desvendar como você. Ninguém prestou tanta atenção nos detalhes, nas estranhezas, nas particularidades. E eu não quis romper bruscamente com o passado, mas o tempo chega, agressivo, e leva as coisas pra longe – dizem que longe é quase um esquecimento.  Não precisamos nos lembrar sempre, mas o que fomos não foi feito pra esquecer.

As descidas na ladeira pediram por freios, a rapidez da parada nos capotou. Tropeçamos com os passos em câmera lenta, dá pra entender? O acidente foi grave. Só sei que continua estranho precisar de lupa pra enxergar um passado enorme. Foi desconfortável nos reduzir por necessidade. Você disse “Rápido como veio, foi”. Sabemos – como canta a banda que você me apresentou  em cantorias com o nascer do sol – meu bem, tudo mudou.

7 comentários:

  1. "Sempre nos considerei rabisco transformado em poesia, mas de repente me parece que a poesia regrediu e viramos redação clássica ensinada. (...) As descidas na ladeira pediram por freios, a rapidez da parada nos capotou". Perfeito!
    C.

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  2. Já citei pra ti uma vez e vou citar de novo um trecho da Martha, que cabe perfeitamente no que sinto lendo teus textos.
    "Deus me aparece nos livros, em parágrafos que não acredito que possam ter sido escritos por um ser mundano: foram escritos por um ser mais que humano."
    Sem mais. Por favor, nunca pare de escrever! :)

    Catarina.

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  3. Foda, fodaa, fodaaaa!!! Sem mais mando mto bem!! ;D

    "Não existe presença, no máximo uma saudade comportada que grita na minha janela vez ou outra e senta tímida no canto, de castigo."

    http://www.luismacedo.com/

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  4. P-E-R-F-E-I-T-O!
    Amei msm o texto, sem defeito. O jogo de palavras e a harmonia entre elas n podia ser melhor.
    Bjs

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  5. É singular a forma que você registra o final de uma história, esse colapso no tempo que todos os romances atravessam feito flechas mal afiadas. Elas acertam mas não assassinam de uma vez, nos fazem contar quantas gotas conseguimos sangrar e aumento o volume da dor.

    Mas existe uma definição sutil, que segura pelos braços o amor já condenado e não o deixa simplesmente sentir a queda. Você oferece um páraquedas que não abre e forja essa segurança. Cuida ainda de desveladamente.

    E essa metamorfose do relacionamento é como uma monta-russa em manutenção: Empolga no começo, emociona no processo e desespera no final.

    O 404 é o lugar onde eu consigo compreender as palavras perfeitamente, como se estivessem sendo desenhadas.

    @brunnolopez

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  6. simples, encantador...perfeito!
    esses são seus textos...parabéns!

    beijo

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  7. Sabe que eu sou tua fã e sempre venho e repito. Teus textos são lindos, poéticos, maravilhosos. Eu sempre volto aqui pra me banhar no que tu escreve.
    E que bom que tudo mudou, que se deixe pra trás e que se viva, guardando apenas o que foi verdadeiro.
    Adorei, beijão

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