segunda-feira, 24 de janeiro de 2011

(We) I laugh indoors



"I've been walking in the same way as I did, missing out  the cracks in the pavement and tutting my heel and strutting my feet.
- Is there anything I can do for you dear? Is there anyone I can call?
-No and thank you, please, Madam, I ain't lost, just wandering
Are the wonders of my world."

[Adele]

Eu, outrora inabalável em minhas convicções, sinto a vulnerabilidade de estar sempre  à mercê de condições impostas por terceiros, quartos, quintos. Cresci mais do que queria num decorrer de tempo menor do que devia. Como uma fruta que alcança o estágio maduro prematuramente e sofre a dor da queda antes do previsto. Mas, ora, ultrapassei a linha de presságios, especulações. Submeto-me feliz à continuidade justamente por saber que doer é, sim, bonito. Pois não há sorriso mais belo que aquele que um dia foi sobreposto pela umidez de um chuvisco lacrimal, vezenquando temporal. Não há sorriso mais forte que aquele já derrotado, mas agora vencedor absoluto, premiado.  A liberdade de ser feliz sem resistência. De saber das tristezas, decepções, mentiras e, ainda assim, escolher por simplesmente sorrir. Se ser feliz em meio a brutais tragédias e apesar de tanto "apesar de" for crime, que me prendam então! Não sinto muito se essa felicidade simplória ofende. Meu álibi sou eu e não sei se outra testemunha seria capaz de declarar-me inocente. É que a minha percepção é alternativa, meu bom senso não se sente atraído por hipérboles ou memórias epicamente fantasiadas. Respeito minhas fraquezas e enalteço minha força, reconhecimento mínimo necessário. Pode ser que meu desapego fuja do script habitual, pode ser que meu silêncio seja um pote de insensatez nesse mundo de loucuras entoadas em alto falantes, pode ser que meu egoísmo seja pecado, mas já não me intimidam julgamentos. Sou salva vidas das minhas vidas e essa sentença é irrevogável. Já provei da desobediência de ultrapassar minhas fronteiras, da decepção de saber-me surda ante verdades indesejadas, cega frente a fatos incontestáveis. Já me soube tantas, hoje sei-me essa só, de agora. Mas continuo inúmeras. Uma cética-romântica-narcisista-desapegada-crítica-incomum-tiro-e-alvo que tropeça em pedras mínimas e escala montanhas intimidadoras desafiando as probabilidades. Não hesito, me desafio e descubro-me ainda incompleta de pedaços meus que estou ainda por achar. Não me apresso e nessa caçada sou minha presa. Espasmos de verdades me capturam, deixo-me apreender, aprender. Deram-me alta desse hospício universal e minhas ilegalidades são punidas em cárcere privado. Não, não sou lúcida, tampouco insana. Habito o abismo que separa rotulações e paira sobre o incorrompível entre contestações. Sou uma e só. Sou muitas, acompanhadas pelas muitas outras que moram em mim. Algo além da simples sintaxe, mergulho na semântica paralela e meu entendimento é único. Não peço cúmplices, mas tolerância. Respeito o mundo, os opostos, os negativos, os impunes, os ignorantes. Sou opositora-positiva-inocente-e-ainda-leiga. Peço reciprocidade: respeito, privacidade. Se minha paz não atormenta: passos pra trás, mãos ao alto, armas no chão. Bandeira branca, rendição.

quinta-feira, 13 de janeiro de 2011

Better than revenge



"Life's perfect, it ain't perfect if you don't know what the struggles for. Falling down ain't fallin down if you don't cry when you hit the floor. It's called the past cause i'm gettin past and I ain't nothing like I was before. You ought to see me now. Yes, I was burned, but I call it a lesson learned. Mistake overturned, so I call it a lesson learned. My soul has returned, so I call it a lesson learned. Another lesson learned."

[John Mayer & Alicia Keys]

A faca ressurge desrespeitando a quietude serena da cicatriz. A dor, já não mais sentida, ofende-se com a ousadia do ataque. Não bastou uma vez? O corte foi discreto em superfície, mas histérico em profundidade. Não houve anestesia ou analgésico, mas uma dor com olhos abertos e pele rasgada, sangue exposto e coração nas mãos. A faca, impensadamente impulsiva, avança pelas beiradas na tentativa de um novo corte, mas beira cócegas. A pele, agora renovada e mais forte, não se deixa romper. A cicatriz, agora imponente, dita as regras do jogo. E ganha, pela primeira vez. A vitória da revanche, a satisfação da vingança. Não que a faca sinta a derrota, de fato, mas perder é sempre bom pra quem tem como costume machucar. 
Podia ser a pele flexível e deixar-se sangrar de novo, mas a objeção é involuntária e a faca, velha conhecida; o sacrifício não valeria a pena. A cicatriz hoje é história, só história. Pode ser que lateje dia ou outro, mas nunca mais será ferida aberta. Tornou-se lembrança e não presença. Já não é a pele que rasga, mas a faca que entorta. Porque pele pode sim ser mais resistente que metal quando cobre um coração endurecido pelo tempo. Porque a pele tem a cicatriz como troféu de superação, enquanto a faca sai, afiada, numa luta vã contra tecidos invencíveis. Porque a pele é regenerada em futuro enquanto a faca entorta-se com o peso forte do passado. Porque a pele tem, agora, a faca em mãos.